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Introdução

Desde a promulgação, no Brasil, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva – PNEEPEI, em 2008, vive-se uma trajetória de mudanças estruturais nos sistemas de ensino, do ponto de vista organizacional, pedagógico, social e cultural, fomentadas pela orientação de que estes devem organizar as condições de acesso aos espaços, aos recursos pedagógicos e à comunicação, buscando-se a promoção da aprendizagem e a valorização das diferenças, de modo a atender às necessidades educacionais de todos os estudantes (Brasil, 2008).

Esta orientação encontra-se alinhada à Lei de Diretrizes de Bases da Educação – LDB[1] (Brasil, 1996) e à Constituição Federal (Brasil, 1988), que define a educação como direito de todos e dever do Estado, a qual deve garantir um ensino pautado pelo princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; bem como alinhada ao movimento mundial, que ganhou força na última década do século XX, em defesa do direito de todos os estudantes de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação[2].

Nessa perspectiva, a PNEEPEI (Brasil, 2008) vem orientar os sistemas para que as escolas comuns sejam inclusivas, garantido aos estudantes que compõem o público da educação especial[3] a transversalidade dessa modalidade de ensino desde a educação infantil até a educação superior, além de :

« Atendimento educacional especializado; continuidade da escolarização nos níveis mais elevados do ensino; formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão escolar; participação da família e da comunidade; acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e informação; e articulação intersetorial na implementação das políticas públicas. »

Brasil, 2008, p. 10

Em meio aos processos de cada rede e sistema educacional, em cada estado da federação e os 5.570[4] municípios, o Presidente da República Jair Bolsonaro, por meio do Decreto nº 10.502/2020, institui a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida, a qual retoma a perspectiva da escola especializada (ou especial) e das classes especializadas em escolas comuns.

Santos e Moreira (2021) realizaram um estudo qualitativo, de abordagem documental e bibliográfica, pautado em uma análise crítico-interpretativa das disposições gerais, princípios, objetivos e diretrizes presentes no Decreto nº 10.502/2020. Neste estudo, concluíram que “a ‘nova política’ instituída pelo governo federal é a materialização do retorno às propostas segregacionistas e excludentes que marcam a história da educação especial no Brasil, ainda que revisto de novas roupagens e configurações” (p.156).

Devido às manifestações de instituições públicas e sociedade civil organizada, com relação à inconstitucionalidade do decreto, este foi suspenso em decisão liminar pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, que convocou audiência pública e ouviu especialistas por dois dias seguidos, em agosto de 2021, embora, até o presente momento, não se pronunciou sobre a decisão final.

Compondo a justificativa para a mudança, no documento da “nova política” vem apresentando um diagnóstico da educação especial, destacando o número ainda insuficiente de professores com formação adequada para uma escola inclusiva. Destaca :

« Tão importante quanto o número de educandos atendidos é o número dos professores da educação básica que têm alguma formação para atuar com educandos do público-alvo da educação especial. (...) apenas 5,8% dos professores que atuam na educação básica em todo o País fizeram cursos destinados à formação continuada para atuarem com o público-alvo da educação especial. (...) Nesses cursos, geralmente as práticas de intervenção baseadas em evidências científicas têm sido abordadas de forma muito incipiente. A PNEE 2020 coloca-se diante dessa realidade para ajudar a transformá-la. »

Brasil, 2020, p. 24

Cabe destacar que o tema da formação de professores perpassa toda a história da educação no Brasil e certamente em alguma medida permanecerá como pauta constante, tendo em vista as transformações sociais, políticas e tecnológicas que demandam mudanças nos modos de fazer e de estar no espaço escolar. Mas cabe destacar que os investimentos públicos nesse segmento, historicamente, estiveram sempre aquém do necessário para a universalização do acesso à educação escolar, a garantia da permanência e da aprendizagem (Gatti, 2010).

A partir da LDB, promulgada em 1996, verifica-se grande número de propostas sobre a formação de professores, as quais foram sistematizadas nas décadas seguintes (Borges et al, 2012; Saviani, 2009). Desse modo, somente a partir do século XXI surgem Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a formação de professores[5]. Cabe ainda destacar, na sequência à implementação da PNEEPEI (Brasil, 2008), em 2009, fora instituída a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica[6], orientando a atuação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES no fomento a programas de formação inicial e continuada dos profissionais do magistério para as redes públicas de educação básica, em regime de colaboração entre a União, estados, Distrito Federal e os municípios. Entre seus objetivos, destaca-se o de “ampliar as oportunidades de formação para o atendimento das políticas de educação especial, alfabetização e educação de jovens e adultos, educação indígena, educação do campo e de populações em situação de risco e vulnerabilidade social” (Brasil, 2009, s/p). Desse modo, apresentando uma perspectiva de formação para uma escola inclusiva, para todos, dentre estes, estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento/TEA e altas habilidades.

Nesse contexto, em certa medida, ampliaram-se as ofertas de cursos de formação continuada de professores referentes à temática da educação especial e inclusiva. Muitos destes em nível de pós-graduação lato sensu, oferecidos por instituições públicas e privadas, os quais conferem o título de especialista sob a chancela de aprovação pelo Ministério da Educação.

Esta formação, em muitos casos, habilita o professor para o trabalho de atendimento educacional especializado – AEE, o qual congrega o caráter de apoio, suplementar e/ou complementar, ao estudante público da educação especial, articulando-se à proposta pedagógica desenvolvida na sala de aula comum. O AEE tem como função (Brasil, 2008, p.10) “identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas”, por meio de atividades como “programas de enriquecimento curricular, o ensino de linguagens e códigos de comunicação e sinalização e tecnologia assistiva” (ibidem). Pode ainda ser oferecido dentro do espaço da escola comum ou em instituições conveniadas, desde que no contraturno escolar do aluno atendido. Contudo, o AEE.

« se efetiva como recurso didático especializado, diluído na prática adaptada do professor do ensino regular; e como serviço a se recorrer em ambientes específicos – as Salas de Recursos Multifuncionais (SEM’s)[7], ou em instituições não escolares, especializadas e conveniadas ao sistema público de ensino, com fins de complementação ou suplementação ao ensino regular. »

Neves et al, 2019, p. 9

Entretanto, as ações do AEE podem ser incipientes se desarticuladas do trabalho conjunto, coletivo, em parceria e colaboração, envolvendo os professores (regentes ou especialistas) da classe comum (Neves; Rahme, 2021). Tal constatação nos convoca a pensar na formação que se faz necessária a estes profissionais, os quais respondem pelos processos pedagógicos de todos os seus alunos, inclusive dos que compõem o público da educação especial.

A partir deste cenário, o presente trabalho propõe, portanto, uma discussão acerca da formação de professores para uma escola inclusiva, com foco nos desafios para a efetivação de um trabalho colaborativo entre os docentes – professores da sala comum e professores do AEE –, previsto nas políticas educacionais.

Nessa perspectiva, pretende-se chamar a atenção para elementos das singularidades dos professores como parte destes desafios, bem como destacar a importância de se considerar tais elementos nas propostas de formação para a inclusão dos alunos com deficiência na classe comum.

De modo a fomentar este debate, apresenta um recorte dos dados de uma pesquisa-intervenção de orientação psicanalítica, em desenvolvimento, realizada em escolas da rede pública municipal de ensino da cidade de Belo Horizonte (MG), sublinhando-se a importância de se incluir na formação (inicial, continuada e cotidiana) aquilo que escapa às políticas: a subjetividade daqueles que as concretizam.

Formação de professores para a educação especial na política educacional brasileira

A partir da LDB (Brasil, 1996), a educação especial é compreendida como modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino. A lei assegura o direito à permanência dos estudantes público da educação especial nas escolas comuns, por meio de serviços de apoio especializado, quando necessário, bem como indica o atendimento educacional “em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular” (Ibidem).

Já a partir da PNEEPEI, a educação especial é compreendida como “modalidade de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional especializado, disponibiliza os recursos e serviços e orienta quanto a sua utilização no processo de ensino e aprendizagem nas turmas comuns do ensino regular” (Brasil, 2008, p.10).

Nesse contexto, segundo dados do Censo Escolar[8], entre os anos de 2003 e 2015, o número de matrículas de estudantes da educação especial, nas classes do ensino comum, passaram de 145.141 a 750.983. A perspectiva da educação inclusiva, portanto, fomentou a ampliação do público das escolas brasileiras, bem como a ampliação da sua diversidade.

Uma das barreiras para a efetivação da educação especial na perspectiva de uma educação inclusiva certamente consiste na formação dos professores. Estes, sobretudo aqueles que iniciaram a carreira de magistério antes da vigência da PNEEPEI, a partir de 2008 (mas não somente estes), não raro queixam da falta de preparo, da falta de saberes os quais julgam os necessários para lidarem com esta diversidade, da falta de formação (Neves; Rahme, 2021). Entretanto, muitas vezes não sabem dizer exatamente o que lhes falta quando estão no cotidiano da escola, diante do desafio de ter 1 a 3 estudantes com diagnósticos que os enquadram no público da educação especial.

Os documentos nacionais constituídos a partir do marco normativo de 2008, referentes à formação geral de professores, sugerem a introdução de conhecimentos do campo da educação especial como componente dessa formação, embora estes não explicitem tais conhecimentos.

As Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN para a formação de professores implantadas em 2015, sete anos depois da PNEEPEI (Brasil, 2008), tratam a formação pautada no atendimento à diversidade, “respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, de faixas geracionais, de classes sociais, religiosas, de necessidades especiais, de diversidade sexual, entre outras” (Brasil, 2015, p.8), orientando que :

« os cursos de formação deverão garantir nos currículos, além dos conteúdos específicos da respectiva área de conhecimento, conteúdos relacionados aos fundamentos da educação, políticas públicas e gestão da educação, direitos humanos, diversidades étnico-racial, de gênero, sexual, religiosa, de faixa geracional, Língua Brasil eira de Sinais (Libras), educação especial e direitos educacionais de adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas. »

Brasil, 2015, p.11

No bojo das mudanças radicais ocorridas no governo federal, a partir de 2016, são instituídas novas DCN, em 2019. Organizam-se a partir de três eixos norteadores para a formação inicial e continuada – conhecimento, prática e engajamento, alinhados exclusivamente às competências e conteúdo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a Educação Básica. Com relação ao tema da Educação Especial, indica que todos os cursos em nível superior de licenciatura devem abordar os “marcos legais, conhecimentos e conceitos básicos da Educação Especial, das propostas e projetos para o atendimento dos estudantes com deficiência e necessidades especiais” (Brasil, 2019, p.7). E, por fim, indica que as licenciaturas voltadas para modalidades especificas, entre elas a educação especial, “por constituírem campos de atuação que exigem saberes específicos e práticas contextualizadas, devem estabelecer, para cada etapa da Educação Básica, o tratamento pedagógico adequado, orientado pelas diretrizes do Conselho Nacional de Educação (CNE)” (Ibidem, p. 9).

Nesse contexto, a temática da educação especial vem sendo contemplada, mesmo que minimamente, nos currículos dos cursos de formação inicial de professores – Pedagogia e demais Licenciaturas. E em diálogo com as políticas nacionais, as redes públicas de ensino, nos estados e municípios, vêm construindo estratégias para a formação continuada de professores, seja a formação em serviço, no cotidiano escolar, ou em espaços externos à escola, a partir de parcerias com as instituições de ensino superior e centros de formação.

A seguir, passar-se-á a abordar a especificidade da rede municipal de ensino de Belo Horizonte.

A educação especial e a inclusão escolar na rede municipal de ensino da cidade de Belo Horizonte

No município de Belo Horizonte, desde a década de 1990, a rede municipal de ensino – RME/BH vem empregando esforços para manter vigente uma educação inclusiva, ou seja, uma escola para todos, em diálogo com os territórios e as comunidades. Nesse sentido, em 2004, data anterior à promulgação de PNEEPEI (Brasil, 2008), estabeleceu suas Diretrizes para a Educação Inclusiva, as quais orientam o atendimento aos alunos público da educação especial nas escolas comuns. No que se refere ao percurso escolar destes estudantes, destaca-se no referido documento (Belo Horizonte, 2004) :

« Os alunos com deficiência (...) e demais colegas de sala terão registradas todas as propostas pedagógicas organizadas a partir das suas necessidades e habilidades construídas em parceria com os vários atores do processo educativo escolar. Esses registros serão orientadores para se traçar as novas propostas pedagógicas, que terão por eixo as necessidades de cada aluno durante todo o seu percurso escolar. A partir desses apontamentos e das observações cotidianas, os processos de aprendizagens dos alunos estarão em constante avaliação. Alguns alunos podem necessitar ainda, de atendimentos específicos às suas necessidades e ministrados pelo professor especializado, que lhes destinarão os acompanhamentos necessários no espaço escolar após planejamento das propostas com o professor referência (s/p). »

A partir da PNEEEI (Brasil, 2008), a RME/BH passa então a se organizar para ampliar o atendimento educacional especializado – AEE, o qual já vinha minimamente sendo oferecido em salas de recursos – SRM localizadas em escolas polo, desde o início da década de 1990, visando a complementar o ensino, no contraturno escolar, para alunos com deficiências físicas, sensoriais e transtornos de ordem neurológica, apresentando necessidades específicas (Oliveira et al, 2009).

Nessa nova perspectiva, a RME/BH passa a estabelecer suas normas para organização e funcionamento do AEE, considerando a necessidade de:

« normatizar o serviço do Atendimento Educacional Especializado - AEE para alunos com deficiência, transtornos do desenvolvimento ou altas habilidades; estabelecer a uniformidade de critérios de caracterização, organização e funcionamento do serviço; constituir equipe profissional para o Atendimento Educacional Especializado – AEE »

Belo Horizonte, 2009a, s/p

Diante disso, dá-se início à contratação de professores para compor a equipe do AEE (Belo Horizonte, 2009b), o qual passou a ser ofertado de acordo com as orientações da PNEEPEI, a partir de 2010.

Passada uma década, em 2019[9], a RME/BH conta com 69 Salas da Recursos em escolas localizadas nas nove regiões administrativas do município; e 93 professoras para os atendimentos aos quase 1500 estudantes que frequentam o AEE. As ações que compõem a política de inclusão escolar dos estudantes da educação especial envolvem (Blaess; Costa, 2021) :

« Matrícula compulsória; Transporte escolar acessível aos estudantes do Ensino Fundamental que fazem uso de cadeira de rodas ou apresentam dificuldades de locomoção; Projeto de disseminação da Libras na comunidade escolar; Auxiliar de apoio ao educando para os estudantes que necessitam ser auxiliados por outra pessoa para locomoção, alimentação e manter-se junto aos demais estudantes na sala de aula e demais dependências da escola; Acessibilidade arquitetônica; e Acessibilidade pedagógica, a partir do AEE em parceria com o professor da sala de aula comum, contando com que os professores trabalhem de forma colaborativa »[10].

Entre 2014 e 2015, foi produzido pela secretaria municipal de educação material contendo diretrizes para a organização do trabalho pedagógico e avaliação da prática pedagógica, nos quais constam capítulo ou tópicos que discorrem sobre a inclusão escolar, onde se destacam a participação do professor e o trabalho em colaboração.

« Para o desenvolvimento de práticas pedagógicas inclusivas, é de fundamental importância que o professor, em cada ciclo e/ou disciplina que atua, desenvolva uma atitude investigativa na busca do recurso, da atividade ou da mediação que melhor atendam ao seu estudante com deficiência. [...] Assim, recomendamos que o professor seja protagonista nas decisões pedagógicas sobre o trabalho com seus alunos com deficiência e que inclua no seu planejamento a experimentação de recursos variados (cores, ilustrações, tamanhos, formas etc.) e relacionados ao conteúdo proposto para toda a turma.

Belo Horizonte, 2014a, p. 89

É o conhecimento do professor sobre seu estudante com deficiência, transtorno do espectro do autismo e altas habilidades/superdotação que, conciliado ao apoio do serviço de Atendimento Educacional Especializado, poderá produzir um processo de desenvolvimento e aprendizagem significativo para esse estudante. As tecnologias assistivas e outros meios de acessibilidade só poderão representar soluções pedagógicas se utilizadas sob olhar e o pensar atentos do professor. »

Belo Horizonte, 2015, p. 52

Nesse contexto, na RME/BH, os estudantes que compõem o público da educação especial têm o acesso ao direito à escolarização na escola comum, podendo contar com o atendimento educacional especializado, caso seja do desejo da família, o qual é de responsabilidade de um docente especializado, que os atende nas salas de recursos localizadas na própria escola ou numa escola polo para a qual o estudante se desloca no contraturno.

Além disso, nos casos em que seja necessário, sobretudo quando o estudante tenha recebido um diagnóstico via laudo médico, pode contar com o suporte de um Auxiliares de Apoio ao Educando[11], profissional sem formação específica que atua nas salas de aula que contam com crianças com deficiência, as quais demandem auxílio para a locomoção, alimentação, comunicação ou mesmo a interação. Esta função, mencionada em documentos federais[12] desde a promulgação da PNEEPEI (BRASIL, 2008), mais recentemente vem considerada na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência[13], a partir da seguinte definição :

« Cap. I, Art. 3º, XIII - profissional de apoio escolar: pessoa que exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência e atua em todas as atividades escolares nas quais se fizer necessária, em todos os níveis e modalidades de ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas. »

Brasil, 2015a, s/p

Na RME/BH, os Auxiliares são contratados por empresa terceirizada a qual não oferece treinamento ou formação significativa para o desempenho da função, explicitando as atribuições nos editais de processo seletivo público simplificado[14] para o cargo. A formação oferecida a estes profissionais se resume em dois encontros anuais, ocorridos nos meses de férias escolares – julho e janeiro – onde são ministradas palestras sobre as deficiências, sobretudo ministradas por profissionais da saúde, os quais apresentam informações técnicas referentes a cuidados específicos como manuseio de sondas e bolsas coletoras utilizadas para alimentação ou excreção.

Quanto aos docentes de atendimento educacional especializado, estes participam de encontros coletivos semanais com seus gestores imediatos para a discussão de questões estruturais e pedagógicas da prática cotidiana do AEE.

Já com relação às professoras regentes (pedagogas) e especialistas (licenciadas para lecionar em áreas específicas), a formação para a educação especial fica a cargo da formação inicial ou continuada – por meio de iniciativas próprias ou que porventura possam ser ofertadas pela secretaria de educação do município e pela escola. Estas professoras, não raro, queixam-se da falta de preparo, da falta de saberes os quais julgam os necessários para lidarem com os estudantes que compõem o público da educação especial (Neves; Rahme, 2021). Quais seriam estes saberes e qual formação seria necessária a estes docentes para uma educação inclusiva?

Partindo-se do que consta nos principais documentos – em nível nacional e municipal – que regem a política de educação de estudantes da educação especial na escola comum na rede municipal de ensino de Belo Horizonte, podemos pensar que a formação das professoras regentes e especialistas deveria ou poderia se dar no cotidiano do trabalho colaborativo, ou seja, por meio da parceria e do diálogo com as professoras do atendimento educacional especializado.

Nesse sentido, encontra-se em desenvolvimento uma investigação referente aos desafios de se realizar um trabalho conjunto, em colaboração, entre estes sujeitos. Sem desconsiderar a existência de desafios estruturais, que perpassam aspectos históricos, econômicos, sociais, organizacionais, entre outros, a investigação chama a atenção para elementos da dimensão das singularidades, ou seja, aspectos da subjetividade que escapam às normativas e que só podem ser tratados no um a um (Neves; Rahme, 2021). Desse modo, trata-se de uma investigação que tem como orientação algumas das contribuições da teoria psicanalítica à educação; e, do ponto de vista metodológico, constitui-se como pesquisa-intervenção, realizada a partir do uso do dispositivo da Conversação, direcionado a grupos de professoras em escolas inclusivas.

Pesquisa-intervenção de orientação psicanalítica com professoras na escola inclusiva

Apesar de se constatar avanços nas políticas públicas, na formação de professores e na estrutura das escolas, deparamo-nos com dificuldades na realização de um trabalho conjunto por parte dos profissionais responsáveis pela aprendizagem e desenvolvimento dos estudantes da educação especial, fundamental à efetivação da escolarização destes, numa perspectiva inclusiva.

Vilaronga & Rios (2014) apresentam uma pesquisa realizada em escolas do município de São Carlos – SP, onde constatam a necessidade da proposta de um ensino colaborativo ou coensino, que consiste em práticas colaborativas entre os professores especializados e os da sala comum, para o apoio à inclusão escolar. Concluem que a literatura científica relacionada a esta proposta, apesar de promissora, evidencia a necessidade de mais estudos sobre a colaboração entre estes profissionais nas escolas, bem como da preparação efetiva dos profissionais que atuam no atendimento especializado.

As autoras destacam que é preciso discutir na escola questões relacionadas ao tempo de planejamento em comum entre os profissionais; aos conteúdos que devem ser incluídos no currículo; às adaptações curriculares; à distribuição de tarefas e responsabilidades; às formas de avaliação; às experiências em sala de aula; aos procedimentos para organização da sala, à comunicação com alunos, pais e administradores; ao acompanhamento do progresso de aprendizagem destes estudantes (Vilaronga; Rios, 2014, p.147).

A falta de diálogo entre os profissionais envolvidos certamente significa um dos grandes fatores para a não efetivação de uma educação inclusiva, conforme preconizam as políticas e a legislação. Os motivos para este desencontro são muitos. Podemos citar como um deles a falta de tempo disponível para tal, embora, muitas vezes, o espaço de AEE se encontre localizado próximo ou mesmo dentro do espaço da escola. Afirma-se falta de tempo: por parte do professor regente da classe regular que, em seu horário de planejamento, tem que se dedicar às atividades do total de alunos que compõem a classe; por parte do professor especializado que, não raro, encontra-se sobrecarregado com o grande número de alunos na sala de recursos multifuncionais.

Anjos et al (2009), em pesquisa que analisou os discursos presentes e em enfrentamento nas falas dos professores responsáveis pelo atendimento a alunos com deficiência, numa experiência de inclusão escolar, destacam :

« (...) separando o seu fazer do fazer coletivo, o professor passa a entender a inclusão como tarefa somente sua, circunscrita aos limites do pedagógico e imposta a partir de forças externas. Assim, a produção de processos excludentes não é enfrentada, e o processo inclusivo limitado à sala de aula ou, na melhor das hipóteses, à escola está fadado ao fracasso »

2009, p.127

Nessa perspectiva, Mrech (2003) destaca que os professores seguem a rotina de trabalho, de uma escola a outra, de modo solitário, sem condições para refletir e nem mesmo construir um saber-fazer diante de um aluno que apresenta necessidades educacionais específicas, acreditando que o saber para tal está fora, em algum lugar, ao qual ele não acede.

Sem desconsiderar as questões objetivas que inviabilizam o trabalho conjunto e o diálogo entre os docentes envolvidos diretamente na escolarização de estudantes com deficiência na escola comum, interessa aqui levantar aquilo que se refere a elementos da subjetividade que constituem os sujeitos professores, os quais possam culminar em impasses – na interlocução entre estes profissionais no espaço escolar, na capacidade de transmissão, e assim, consequentemente, no desenvolvimento dos alunos envolvidos, os quais acabam, muitas vezes, permanecendo excluídos das possibilidades de aprendizagem.

Para abordar essa dimensão subjetiva, recorre-se aqui às contribuições da teoria psicanalítica ao campo da educação, na medida em que nos permite considerar a subjetividade e o desejo como motor da atividade simbólica. Ou seja, para além da coerência, é preciso levar em conta o sujeito do inconsciente que se manifesta por meio de atos falhos, dos sonhos, mas, sobretudo dos sintomas.

Sintoma é um conceito que atravessa a construção da teoria psicanalítica e orienta sua práxis desde sua origem, com Freud, sendo elaborado também em diversos momentos da obra de Lacan. Conde (2008) desta que, ao longo da obra de Freud, o sintoma aparece como expressão de um conflito psíquico, como mensagem do inconsciente e como satisfação pulsional; e que, por sua vez, o conceito em Lacan pode ser compreendido de três modos: o sintoma como mensagem endereçada ao Outro (o grande outro – um lugar simbólico que oferta os significantes e abriga a linguagem); como gozo (que excede ao desejo); e como produção e invenção do sujeito (uma solução diante do impossível da linguagem).

A tarefa educativa, juntamente com a de governar e a de psicanalisar, foi concebida por Freud como sendo algo que congrega o impossível. Esse impossível se refere ao desafio de se alcançar a interferência desejada no outro. Ou seja, partir do equívoco que constitui a estrutura da linguagem, bem como dos invisíveis que circulam na transmissão, a tarefa educativa se constitui como não-toda, o que, nos ambientes heterogêneos da educação para todos, pode promover a angústia e a desistência diante do ato de ensinar por parte dos docentes (Neves, 2014). Nesse sentido, podemos pensar que a presença de alunos com deficiência na classe põe acento no desafio da heterogeneidade, desse modo, convocando-nos a lidar com o não-todo que configura o impossível.

Conversação de orientação psicanalítica como metodologia de pesquisa

É a partir desta discussão que a pesquisa-intervenção[15], de orientação psicanalítica, intitulada “Psicanálise e educação inclusiva: conversação com professores da classe regular e do atendimento educacional especializado – AEE”, traz como objetivo não somente constatar uma realidade, mas, também, aprender sobre tal realidade a partir dos sujeitos envolvidos, além de congregar a aposta numa intervenção nessa realidade. Portanto, trata-se de uma pesquisa que considera os elementos que possam surgir, bem como seus efeitos, por vezes responsáveis por provocar uma mudança de posição por parte dos sujeitos em relação aos impasses subjetivos relacionados à educação escolar.

Nessa perspectiva, parte-se de base teórica psicanalítica, que considera a fala como lugar onde habita o sujeito; e propõe-se o uso da Conversação com o objetivo de levantar as dificuldades dos docentes no que se refere ao trabalho colaborativo para a educação dos alunos com deficiência na escola comum.

Tal metodologia tem origem no dispositivo clínico elaborado por Jacques Allain Miller nos anos 1990, como possibilidade de oferta da palavra a grupos silenciados pelo sofrimento sociopolítico. O instrumento, que toma como partida aquilo que não vai bem, busca pela fala “que escapa” ao sentido, e ao provocar surpresa no próprio locutor, aparece desregrada pelas limitações éticas, sociais e culturais, convidando-o a narrar e reorganizar suas próprias experiências, questionar os discursos já pré-concebidos e identificar o impasse (Miller, 2009). Neste sentido, a Conversação, quando utilizada para além de sua vertente puramente clínica, oportuniza a construção de novos sentidos e modificação das dinâmicas existentes no contexto coletivo – nesse caso, o da escola, demonstrando-se, assim, passível de aplicação em investigações no campo educacional (Santiago et al, 2006).

Para desenvolvimento da investigação, com relação ao campo, levantou-se quais escolas da rede pública municipal do município de Belo Horizonte contavam com uma infraestrutura considerada adequada, no ano de 2018, como: salas de AEE devidamente equipadas e localizadas dentro do próprio prédio da escola, profissionais capacitados para o atendimento especializado, além de tempos e espaços suficientes para a sistematização de reuniões e encontros entre os professores responsáveis por pelo menos um mesmo aluno – na sala regular e sala de AEE. Buscava-se, desse modo, minimizar justificativas calcadas na estrutura da rede de ensino e/ou do sistema educacional. Após contato com tais escolas, elegeu-se três estabelecimentos de ensino entre aquelas que aceitaram a oferta da pesquisa e que reconheceram suas dificuldades na efetivação de um trabalho conjunto, em colaboração.

A investigação se efetiva a partir de um conjunto de três Conversações consecutivas, conduzidas pelas pesquisadoras, durante uma hora e meia, uma vez por semana, com grupos de professores nas escolas eleitas. Cada Conversação é gravada e transcrita, de modo que se possa recolher os elementos centrais das falas dos participantes, os quais são retomados como ponto de partida para o encontro seguinte.

De modo geral, o cotidiano da escola dificulta agrupar um número grande de decentes para as Conversações, tendo em vista os raros momentos fora de sala de aula. Diante disso, bem como da aposta de que, cientes da delimitação do tempo, os sujeitos se mobilizassem para o trabalho, constituiu-se um recurso lógico para manejar o tempo, fundamentado na indicação de Lacan, extraída do texto “O tempo lógico e a asserção de certeza antecipada” (Lacan, 1978), onde o autor parte da análise de um sofisma para tratar da modulação temporal – o instante de olhar, o tempo para compreender e o memento de concluir. De acordo com Lacan (1978), “Deve-se temporalizar a referência do ‘eu’ aos outros enquanto tais, para, dialeticamente, reduzir o momento de concluir o tempo para compreender, a durar tão pouco quanto o instante de olhar” (p.84).

Elegeu-se, portanto, o número de 3 Conversações, inspirando-se nessa perspectiva do tempo lógico indicado por Lacan (1998), considerando, na fala coletivizada: o instante de olhar, que de certo modo perpassa o falar sobre o problema como queixa, sem uma implicação subjetiva; o tempo para compreender, como o tempo de pensar sobre o que se falou referente ao problema, com certa abertura para a dúvida; e o momento de concluir, sob a aposta de se retomar o falar sobre o problema, dessa vez com a produção de algo novo.

É nessa produção de algo novo que reside a possibilidade de implicação por parte dos sujeitos com o dizer, de modo que possa operar alguma mudança subjetiva que venha a se refletir no ato educativo.

Um recorte de dados

Será apresentado a seguir um recorte da pesquisa, a partir do relato resumido da intervenção realizada em uma das três escolas inicialmente eleitas, as quais reconheceram suas dificuldades na efetivação de um trabalho conjunto, em colaboração.

Nesta escola, houve adesão de docentes no turno da manhã e no turno da tarde, constituindo, portanto, 2 grupos que se reuniram para as Conversações, fazendo uso do horário diário de “Atividades coletivas de planejamento e avaliação do trabalho escolar”, referente a uma hora de planejamento de atividades, instituído na rede desde o final da década de 1990.

Será apresentado o percurso das Conversações, a partir de elementos centrais das falas dos participantes, referente a um dos grupos, do qual participaram cinco professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental – duas eram alfabetizadoras, duas do atendimento especializado (AEE) e uma dedicada ao ensino específico de língua portuguesa.

A primeira Conversação foi aberta com a questão: para se alcançar um trabalho pedagógico com os estudantes da educação especial, faz-se necessário um trabalho conjunto entre professoras da sala de aula e da sala de AEE; como se efetiva este trabalho nesta escola, quais os desafios e possibilidades?

As professoras iniciaram destacando as dificuldades, com ênfase na falta de formação, nas falhas no modelo de política estruturado pela rede e em suas frustrações diante do modo como a inclusão vinha ocorrendo. Enfatizaram a impossibilidade do trabalho conjunto, sobretudo pela falta de tempo para encontros de discussão. Percebeu-se desinformação sobre o trabalho desenvolvido pelo atendimento educacional especializado, bem como sobre os percursos de seus próprios alunos na sala do AEE.

Do início ao fim desse primeiro encontro, as participantes usaram o tempo para falarem do problema por meio de suas queixas, sem demonstrarem uma implicação subjetiva, configurando um instante de olhar.

Na segunda Conversação, a fala do grupo circula de modo que cada professora especifica casos e acontecimentos que causaram dificuldades, evidenciando um mal-estar atrelado à impotência diante do que configura um impasse e sobre o qual não conseguem dizer.

O tema do trabalho colaborativo sai do foco da conversa e as professoras falam das dificuldades em relação às crianças que não aprendem. Uma das professoras questiona em tom de afirmação: “e tem como lidar com uma criança que eu não consigo saber o que ela aprende?!” Ao se depararem com a dubiedade da frase, produziu-se um breve silêncio que pareceu demarcar um tempo para compreender, ou seja, para se pensar sobre o que se falou referente ao problema, com certa abertura para a incerteza. Daí em diante, as falas se deslocam da queixa em relação outro (a estrutura, a falta de formação, o tempo, a política) para aquilo que toca a cada uma, ainda que de forma coletivizada. Ao se revelar algo de impossível para cada uma, as professoras atribuem a possibilidade do trabalho com o estudante com deficiência à presença de um laudo médico orientador e justificam sua importância por meio da frase: “O laudo é o nosso Norte”.

Na terceira Conversação, as professoras falam da angústia que vivenciam quando não conseguem fazer com que uma criança aprenda o que precisam lhe ensinar e, desse modo, na ausência de resposta para esse enigma do “fracasso”, acabam por apaziguar a angústia buscando responsabilizar algo externo à relação pedagógica.

Neste encontro, constroem a ideia de que a impossibilidade trazida por uma criança lhes causa “uma frustração, um sentimento de culpa misturado com sentimento de impotência”. E, na sequência a esta elaboração, consideraram que a criança com deficiência, de certa forma, já porta algo que anuncia a possibilidade de tal frustração. Desse modo, diante dessa criança, busca-se uma resposta que venha tamponar a angústia e justificar o fracasso supostamente eminente. No momento de concluir, as professoras então retificam a fala do encontro anterior com a produção de algo novo: “O laudo é o nosso álibi”.

Convidadas a retomarem o foco inicial da conversa, ou seja, os desafios do trabalho conjunto entre professoras da sala de aula comum e professoras de AEE, as professoras apresentaram alguma implicação em relação ao problema e concluíram a Conversação esboçando propostas de melhorias nas relações interpessoais, reivindicando momentos em que pudessem trocar ideias e sentimentos em relação os desafios da inclusão nas reuniões gerais realizadas mensalmente na escola.

É possível afirmar que este grupo tenha se beneficiado do espaço proporcionado pela investigação, ao ter se produzido um saber, ao longo das Conversações, referente à frustração (culpa e impotência) diante do que fura o ideal educativo; além de ter sido possível, nesse espaço, apreender a presença de uma recusa ao trabalho conjunto como algo da ordem de um sintoma, ou seja, uma solução para se evitar o contato com o impossível constituinte da tarefa “não toda” da educação, antecipada pela presença de uma criança com deficiência e imaginariamente apaziguada por um documento que nomeia e atesta – o laudo, tanto Norte, quanto álibi.

Em outros termos, ao se abordar as possíveis causas da constatada dificuldade em buscar o trabalho colaborativo, as professoras reconhecem a dificuldade em lidar com o ponto de impossível excluído de suas escolhas pela docência, o qual retorna com a presença de um estudante com deficiência na sala de aula.

Verificou-se que a partir da oferta da palavra a estes sujeitos, foi possível que localizassem os pontos de mal-estar, convergindo para algumas possibilidades de se construir novas saídas. Esses elementos apontam para a importância de um espaço de palavra na escola, para uma formação em serviço, onde se possa incluir o sujeito de desejo, onde se aborde a escolha pela docência, tal como as responsabilidades pulsantes nesse âmbito, as falhas conscientes e inconscientes (im)previstas nos processos educativos.

Desse modo, os dados colhidos apontam que para além das questões objetivas, relacionadas aos tempos e espaços escolares, as dificuldades em realizar um trabalho em colaboração, previsto pela PNEEPEI (2008) e pelos documentos normativos da RME/BH, diz respeito, também, ao desejo dos docentes confrontado com a angústia produzida no trabalho focado na inclusão.

Com esta investigação em andamento, que aborda temática ainda pouco explorada nas pesquisas em educação, pretende-se chamar a atenção para aquilo que escapa ao projeto das políticas públicas: a subjetividade daqueles que a efetivam. Bem como destacar a necessidade de se proporcionar espaço para tal dimensão na escola, no currículo dos cursos de Licenciaturas e nos cursos de formação continuada de professores; quer seja por meio de rodas de conversa em reuniões gerais realizadas nas escolas, quer seja por meio de disciplinas específicas que contem com o subsídio das contribuições da psicanálise à educação.

Considerações finais

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008) inaugura um projeto alinhado à concepção de educação como direito de todos e a escola como espaço de inclusão, onde os estudantes que compõem o público da educação especial estejam na escola comum, apoiados pelo atendimento educacional especializado, visando à complementação do ensino a partir da minimização das barreiras para o acesso à aprendizagem e ao convívio coletivo diversificado.

Passada mais de uma década da promulgação dessa política, podemos inferir que tivemos avanços, sobretudo quando se constata que os estudantes da educação especial em sua grande maioria estão matriculados na escola comum. Certamente que há muitos desafios, para os quais faz-se necessário avançar com investimentos, e não com o retrocesso, cogitando-se uma política que fomente a perspectiva de escolas especializadas e de classes especializadas em escolas comuns, com a prerrogativa da falta de professores com formação adequada, muitas vezes adquirida em cursos com abordagens incipientes no que se refere a práticas de intervenção baseadas em evidências científicas (Brasil, 2020,

O tema da formação de professores é complexo e envolve questões históricos, políticas, sociais, econômicas e culturais. Nessa complexidade, inclui-se a demanda de formação de professores especializados para o atendimento do público da educação especial, no AEE, como também de formação inicial e continuada para uma educação inclusiva, na classe comum, de modo que o trabalho conjunto destes profissionais possa favorecer o acesso à aprendizagem para aqueles que apresentam necessidades educacionais específicas.

Destacou-se aqui que a falta de diálogo entre os profissionais envolvidos certamente significa um dos grandes fatores para a não efetivação da inclusão escolar, conforme preconizam as políticas e a legislação. Os motivos para este desencontro certamente são muitos, entretanto, buscou-se aqui levantar aquilo que se refere a elementos da subjetividade que constituem os sujeitos professores, os quais possam culminar em impasses que interfiram na interlocução e no trabalho conjunto no espaço escolar.

Desse modo, o presente trabalho chama a atenção para aquilo que escapa ao projeto das políticas públicas: a subjetividade daqueles que a efetivam; e que só podem ser tratadas pela via da palavra, no um a um. Aposta-se na relevância de proporcionar espaço para tal dimensão na escola, no currículo dos cursos de Licenciatura e dos cursos de formação continuada de professores.